Na Trilha do Pesquisador

Até se formar em medicina e se tornar grande conhecedor das ciências naturais, Adolpho Lutz passou por várias universidades.
Berna, Leipzig, Praga e Estrasburgo foram as instituições de ensino superior em que ele estudou na Europa. Nesses lugares, conviveu com pesquisadores famosos e que foram muito importantes para desenvolver os seus conhecimentos, como o médico Robert Koch – que descobriu os microrganismos causadores da tuberculose e do cólera – e o cientista Louis Pasteur – que desenvolveu vacinas contra o cólera e contra a raiva.
O convívio com os mais diferentes especialistas fez Lutz se interessar por variados temas da ciência...

Entomologia

Este é o nome da ciência que estuda os insetos. E Lutz era fascinado por esses seres! Sua dedicação era tanta que conseguiu comprovar que esses animais transmitiam doenças aos humanos. Suas pesquisas deram origem a uma nova geração de médicos treinados, e a Entomologia Médica passou a fazer parte dos currículos das universidades.

Mosquisto

Malária Silvestre

Bromélia

LEm 1898, Lutz foi investigar uma doença misteriosa que estava abatendo os operários que trabalhavam na construção da ferrovia que ligaria São Paulo a Santos. Lá, descobriu a malária silvestre – doença causada por um parasita chamado Plasmodium. Descobriu também que o mosquito transmissor era um Anopheles, espécie que se reproduz em águas paradas e armazenadas em plantas como as bromélias, muito comuns na Mata Atlântica, floresta que cobria aquela região.

Depois da descoberta do modo de transmissão da malária, uma comissão de médicos parasitologistas, bacteriologistas, zoólogos, veterinários e botânicos voltou a atenção para os insetos sugadores de sangue, principalmente os mosquitos, buscando possíveis transmissores de doenças parecidas com a malária e a febre amarela.
Veja só o que a descoberta de Lutz provocou: Edwin Ray Lankester, membro dessa comissão de pesquisadores e diretor do Museu Britânico de História Natural, propôs o levantamento de todas as espécies de mosquitos existentes no mundo, para que os especialistas pudessem identificar quais transmitiam doenças ao homem. Para isso, Lankester armou uma rede de alcance internacional para a captura de insetos. Adolpho Lutz, claro, foi acionado pelo cônsul britânico no Rio de Janeiro em março de 1899. Dois meses depois, entregava uma coleção com anotações sobre cada espécie. Esse material serviu para produzir um trabalho de pesquisa sobre os mosquitos do mundo.

Parasitologia

Você, provavelmente, já ouviu falar em vermes, parasitas. Esses seres muitas vezes se alojam em nosso organismo e nos de outros animais. Lutz também se interessou por esta área e estudou os parasitas, especialmente aqueles que causavam males ao homem e aos bichos. Assim, contribuiu para o nascimento da helmintologia – a ciência que estuda os helmintos, como também são chamados os vermes. Até então, os principais parasitas conhecidos eram os de maior porte, por serem mais fáceis de observar. Mas, nada se sabia sobre a transmissão deles e a forma como provocavam doenças. Muitos cientistas até achavam que a presença deles no organismo fosse benéfica, outros pensavam o contrário. Lutz, então, resolveu pesquisar e publicou 40 trabalhos sobre o assunto. Entre eles está um sobre a esquistossomose.

Os Bichos Agradecem

Jacaré

Sabia que, no Brasil, foi Lutz quem deu início ao estudo das doenças dos animais? Ele pesquisou parasitas de bichos como rãs, lagartos, tartarugas, jacarés, cobras, insetos e até de peixes. Também investigou uma doença de nome curioso:

quebra-bunda! ( Quebra-bunda, mal-de-cadeiras, mal-dos-quartos, mal-das-ancas... Todos esses nomes servem para apresentar a doença que afetava, desde 1828, os cavalos da Ilha de Marajó, no norte do Brasil, tendo levado quase à extinção esses animais em 1836. Ninguém tinha identificado o mal - que provocava fraqueza nos membros posteriores dos cavalos - até a chegada de Lutz ao Pará, em 1907. A partir de observações e trabalhos de outros cientistas, Lutz reconheceu que era a doença causada por um parasita do gênero Trypanosoma, até então conhecida apenas no sul do continente americano, que afetava os cavalos da ilha. )

Quebra-Bunda

Novos animais no pedaço

Conheça as espécies que Adolpho Lutz descobriu!

Tityus serrulatus

Tityus serrulatus



Também conhecido como escorpião amarelo, pode atingir até sete centímetros de comprimento. É a espécie de escorpião mais venenosa da América do Sul e foi descoberta por Adolpho Lutz e Oswaldo de Mello Campos, em 1922. No Brasil, pode ser encontrada em Minas Gerais, Bahia, Ceará, Goiás, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Sergipe, Rio Grande do Sul, Espírito Santo, Rio de Janeiro e São Paulo.

 

Paratelmatobius gaigeae

Paratelmatobius gaigeae

 


Essa simpática rã foi descoberta, em 1931, por Adolpho Lutz na Serra da Bocaina, na divisa entre os estados do Rio de Janeiro e São Paulo. Desde então, nunca mais havia sido vista. Em 2005, porém, cientistas reencontraram o pequeno anfíbio, que mede apenas um centímetro e meio, aproximadamente.

 

 

Bufo rubescens

Habitante do cerrado brasileiro, esta espécie de sapo é encontrada dos estados do Pará e do Piauí até Minas Gerais. Foi descoberta por Adolpho Lutz em 1925.

Scinax squalirostris

Scinax squalirostris

 

Conhecida como perereca bicuda, mede cerca de 25 milímetros. É encontrada no Sudeste, Sul e Centro-Oeste do Brasil. Além disso, também está presente na Bolívia, Paraguai, Uruguai e Argentina. Foi descoberta por Adolpho Lutz em 1925.

 

 

Scinax fuscovarius

Scinax fuscovarius

 

Encontrada no Sul, Sudeste e Centro-Oeste do Brasil, assim como na Bolívia, no Paraguai, no Uruguai e na Argentina, essa espécie foi descoberta por Adolpho Lutz em 1925. Vive em ambientes abertos, como pastagens, mas é comum mesmo em áreas desmatadas.

 

 

Scinax perpusillus

Scinax perpusillus

 

Descoberta por Adolpho Lutz em parceria com sua filha, Bertha Lutz, em 1939, essa espécie vive dentro de bromélias em florestas e restingas nos estados do Rio de Janeiro e São Paulo.

 

 

Hyla anceps

Descoberta por Adolpho Lutz em 1929, essa espécie, também conhecida como perereca-zebra, existe apenas no Brasil e é encontrada nos estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais, Espírito Santo e Bahia. Vive em pântanos ou em poças de água em regiões de baixada.

Hyalinobatrachium eurygnathum

Também conhecida como rã de vidro, vive nos estados do Espírito Santo, Minas Gerais e Santa Catarina. Geralmente é encontrada grudada em folhas de plantas e árvores, quase sempre perto de água corrente. Foi descoberta por Adolpho Lutz em 1925.

Colostethus olfersioides

Presente no Rio de Janeiro e em Alagoas, essa espécie foi descoberta por Adolpho Lutz em 1925. Costumava ser muito comum, mas hoje já não é mais encontrada em muitos locais. Vive em florestas, mas também pode ser vista em jardins e plantações. Deixa seus ovos em poças temporárias, e quando eles eclodem, são levados nas costas dos adultos para rios, onde podem completar seu desenvolvimento.

Epipedobates flavopictus

Epipedobates flavopictus

 

Conhecido como sapo-flecha, é encontrado, no Brasil, nos estados de Minas Gerais, Goiás, Tocantins, Pará e Maranhão. Também existe na Bolívia. Vive em fendas de rochas às margens de rios, em campos rupestres ou em meio à vegetação próxima a cachoeiras.

 

 

 

Leptodactylus flavopictus

Leptodactylus flavopictus

 

Esta espécie de rã foi descoberta por Adolpho Lutz em 1926. É encontrada no Sul e no Sudeste do Brasil. É uma espécie rara, difícil de ser vista. Vive em florestas, perto de rios, mas não em áreas abertas.

 

 

Physalaemus maculiventris

Physalaemus maculiventris

 

Encontrada apenas no Brasil, essa espécie de rã, descoberta por Lutz em 1925, vive em uma região que vai do Espírito Santo ao estado de Santa Catarina.

 

 

 

 

Dr. Lutz, ao trabalho!

Conheça as doenças que o cientista brasileiro estudou. E o que descobriu sobre elas!

Febre Amarela

É uma doença que ocorre em países da América Central, da América do Sul e da África. É causada por um vírus e transmitida por mosquitos.
Há dois tipos de febre amarela: a urbana (que ocorre nas cidades) e a silvestre (que ocorre, no Brasil, em regiões de cerrado e florestas). Não há caso da febre amarela urbana registrado em nosso país desde 1942. Já a silvestre... Esta é difícil de acabar, porque o vírus que causa a doença circula naturalmente entre primatas das florestas tropicais. Mas existe uma vacina muito eficaz contra a febre amarela. Assim, quem pega a doença, em geral, são pessoas não vacinadas que entram em áreas onde há febre amarela silvestre.

Febre Amarela



Uma pessoa não transmite febre amarela diretamente para outra. Um mosquito precisa picar alguém que esteja infectado e, após o vírus ter se multiplicado – o que leva entre nove e doze dias –, picar um indivíduo que ainda não teve a doença e não tenha sido vacinado.
Mosquitos Haemagogus são os principais transmissores da febre amarela silvestre, enquanto o Aedes aegypti é quem, em geral, transmite a febre amarela urbana.

 

A febre amarela no tempo de Lutz

Febre Amarela no tempo de Lutz

 

Por volta de 1898, a febre amarela era considerada o problema nº1 da saúde pública brasileira, com muitas vítimas em todo o país. Como os cientistas não sabiam ao certo o que causava a doença e nem como ela se transmitia, era difícil fazer o diagnóstico e também tomar medidas para combatê-la.

 

 

 

 

A luta contra a doença

Adolpho Lutz teve um papel muito importante no combate à febre amarela no Brasil. Durante a década de 1890, avaliou a eficácia de soros e vacinas que eram desenvolvidos para curar ou prevenir a doença. Em 1897, por exemplo, negou a eficácia de um soro desenvolvido por um médico gaúcho, o que rendeu manchetes nos jornais até 1902. Era mais um no

Vacinas Erradas

Lutz também contribuiu para que se aceitasse no Brasil a idéia de que a febre amarela era transmitida por mosquitos. Sabe como? Ele repetiu aqui no nosso país o  que levou os cientistas a essa conclusão e que foi muito importante na história da febre amarela, pois acabou com as dúvidas sobre a transmissão da doença e permitiu que ela fosse combatida.

Malária

É uma doença comum no mundo todo e um problema grave em dezenas de países, sobretudo na África, onde ocorrem 90 de cada 100 casos. Seus principais sintomas são febre alta, dor de cabeça, calafrio, enjôo e vômito.
No Brasil, a doença é pouco conhecida na maioria das regiões, mas é comum na Amazônia, onde são registradas centenas de milhares de casos a cada ano.
Essa doença é causada por um micróbio: o plasmódio. Mas é transmitida ao ser humano pela fêmea do mosquito Anopheles. Ao picar uma pessoa com malária, ela suga o sangue com o plasmódio e, depois, quando pica outra pessoa, passa o plasmódio para ela.
Porém, antes que tudo isso fosse descoberto, havia a crença de que a doença era causada pelos “maus ares” (malaria, em italiano) dos pântanos.

As descobertas de Lutz

Trem

Em 1898, estava sendo construída uma ferrovia entre São Paulo e Santos. Havia muitos casos, entre os operários, de uma doença que causava febre. Seria malária?

Lutz foi até lá. Ele sabia que, em geral, casos de malária eram registrados em locais planos e encharcados. A área onde seria erguida a ferrovia não tinha essas características.

Ainda assim, concluiu que a doença dos operários era malária. Como? Ao examinar o sangue dos trabalhadores e encontrar o micróbio que causa a doença.
Na época, vários pesquisadores se esforçavam para demonstrar que a malária era transmitida por mosquitos. Mas Lutz decidiu investigar as matas de montanhas que havia ao redor do acampamento dos operários, distante de pântanos.  chamou a sua atenção: como picava os trabalhadores! Ao analisá-la, concluiu que se tratava de uma nova espécie de Anopheles.
Veja que interessante: somente em 1899, cientistas confirmaram que a malária era transmitida ao homem por mosquitos Anopheles. Mas, em 1898, Lutz já havia feito essa descoberta. No entanto, apenas publicou suas observações em 1903.

Lepra

Cartaz Hanseníase

A hanseníase, também chamada de lepra, é causada por uma bactéria que se aloja e se multiplica dentro das células que formam a pele e os nervos.
Hoje, sabe-se que o crescimento e a multiplicação desse microrganismo são tão lentos que a pessoa leva bastante tempo para apresentar os primeiros sintomas da doença depois de ter sido contaminada: em geral, de dois a cinco anos.
Como a bactéria que causa a hanseníase tem preferência pelas células da pele e dos nervos, as áreas afetadas perdem sensibilidade ao toque, à dor e ao calor. A doença, no entanto, tem cura e, no Brasil, o tratamento nos postos de saúde do governo é gratuito.
Atualmente, os cientistas acreditam que se pega hanseníase pelas vias aéreas, provavelmente por perdigotos – as gotículas que escapam da boca com a fala ou a tosse – de uma pessoa doente. Assim, quem está em contato freqüente com os doentes corre maior risco de contrair a doença.

No passado, havia muito preconceito com quem tinha essa doença porque, em alguns casos, o seu avanço deixava as pessoas aleijadas. Hoje, se a hanseníase for descoberta no início e o tratamento for seguido corretamente, a pessoa ficará curada e dificilmente sofrerá alguma deformação no corpo.

 

 

 

A lepra no tempo de Lutz

Desde o início da sua carreira profissional, Lutz se interessou pela hanseníase. Na época em que viveu, no entanto, pouco se sabia sobre essa doença. Os cientistas não chegavam a um acordo sobre quais seriam as suas causas, como era transmitida, como deveria ser tratada. Alguns, por exemplo, defendiam que a hanseníase era hereditária: passava de pais para filhos. Outros acreditavam que ela era contagiosa.
A idéia de que a hanseníase era contagiosa ganhou força a partir de 1847, quando o norueguês Amauer Hansen descobriu a bactéria que, hoje sabemos, causa a doença: o Bacillus leprae ou bacilo de Hansen. Na época, porém, era difícil dizer quem tinha razão: os que defendiam que a doença era contagiosa ou os que diziam que era hereditária. Isso porque os cientistas não conseguiam cultivar em laboratório a bactéria e transmiti-la a animais para comprovar que havia uma relação entre esse microrganismo e a hanseníase.

O cientista em ação

Lutz cientista

 

 

Lutz dedicou-se ao estudo da hanseníase por toda a vida. Quando trabalhou no Hospital dos Lázaros – uma instituição no Rio de Janeiro que recebia doentes de lepra –, por exemplo, tentou cultivar em laboratório a Bacillus leprae e transmiti-lo a animais, mas não teve sucesso. Entre 1886 e 1888, tratou de 200 a 250 vítimas de lepra no Brasil, e acompanhou cerca de 50 delas ainda por longo tempo. Na Alemanha, trabalhou na clínica de um grande dermatologista, onde investigou o Bacillus leprae.

Lazaros

No Havaí, realizou estudos e tratou doentes de lepra em Honolulu e na ilha de Molokai, onde eles eram mantidos isolados do resto da população. Esteve sempre a par das descobertas internacionais sobre a doença, organizou eventos em que os cientistas reuniam-se para discuti-la, debatia as questões ligadas a ela e trocou cartas com os maiores especialistas do mundo. Tornou-se, enfim, a maior autoridade do assunto no Brasil.


Todo o prestígio que conquistou, Lutz pôs em jogo quando defendeu uma teoria polêmica: a de que a lepra era transmitida por mosquitos. Essa idéia surgiu de estudos feitos por ele, mas que tinham alguns pontos fracos, apontados por seus colegas. As investigações de Lutz, porém, despertaram o interesse de pesquisadores, que continuaram sua linha de pesquisa. Um deles, Heráclides Souza Araújo, que dedicou mais de 40 anos ao estudo da lepra, concluiu que a doença podia ser transmitida por diversos insetos que se alimentam de sangue. Ainda hoje, no entanto, se sabe pouco sobre como a lepra é transmitida de pessoa para pessoa, embora se acredite que seja por meio de perdigotos de um doente. Ou seja, das gotículas que escapam da boca da pessoa com lepra, quando ela fala ou tosse.