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o tempo dos vice-reis, e mais ainda na primeira metade do século
XIX, o Rio de Janeiro foi uma cidade
insalubre. Ao que tudo indica, a primeira grande epidemia
de febre amarela fustigou a cidade, com enorme virulência,
no período compreendido entre dezembro de 1849 e setembro
de 1850. Numa população de 166 mil habitantes, a
doença causou, segundo as estimativas do médico
Pereira Rego, 90.658 amarelentos e 4.160 mortos. No auge, que
coincidiu com os meses “calmosos” de janeiro, fevereiro
e março, fez mais de 80 vítimas por dia. Desde então,
durante 59 anos a febre assolou a capital, assumindo, em certos
momentos, dimensões de verdadeira hecatombe.
A epidemia de febre amarela teve conseqüências importantes
para a instituição de um novo tipo de medicina que
se vinha constituindo no Brasil desde a década de 1830.
Medicina nova, tanto no que se refere às formas de conhecimento
como ao modo de intervenção na sociedade, particularmente
no contexto urbano. O aspecto mais notável dessa transformação
é o fato de a medicina se tornar social e, portanto, basicamente
preventiva. Em 1850, nomeou-se uma Junta de Higiene para acompanhar
os trabalhos de controle da epidemia. No ano seguinte, ela foi
dotada de um serviço de estatísticas, o primeiro,
ao que parece, da América do Sul.
Em 1855 e 1856 o Rio de Janeiro foi assolado, pela primeira vez,
pela epidemia de cólera-morbo, com 4.828 vítimas.
Entre 1857 e 1860, a mortalidade manteve tendência ascendente,
oscilando anualmente em função da violência
da febre amarela. Em 1865, novo pico de mortalidade em virtude
de uma epidemia de varíola e de outras doenças favorecidas
pela aglomeração das tropas com destino ao Paraguai.
Em 1867 e 1868, a cólera-morbo grassou novamente.
A tuberculose, as doenças intestinais e a malária
crepitavam como flagelos crônicos na capital do Império.
A febre
amarela, em anos mais críticos, chegou a matar 3 a
4 mil pessoas numa população estimada em cerca de
270 mil habitantes em 1872. Após ausência relativamente
prolongada durante a década de 1860, reapareceu no Rio
de Janeiro em 1868 e se manteve até a campanha de erradicação
comandada por Oswaldo Cruz no início do século XX.
Os dois surtos mais graves, em 1873 e 1876, causaram a morte,
respectivamente, de 3.659 e 3.476 pessoas.
Foram os higienistas os primeiros a formular um discurso articulado
sobre as condições de vida na cidade, propondo intervenções
mais ou menos drásticas para restaurar o equilíbrio
urbano. O primeiro plano urbanístico para o Rio de Janeiro
foi elaborado entre as mencionadas epidemias de 1873 e 1876, que
suscitaram acalorados debates sobre a urgência de sanear
a capital e remover a grande massa popular do centro para a periferia,
o que, afinal, acabaria acontecendo com a reforma promovida no
início do século XX pelo prefeito Pereira Passos
e outras autoridades ligadas ao governo de Francisco de Paula
Rodrigues Alves.
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