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Comissão de Profilaxia da Lepra, Adolpho Lutz era relator
de um tema específico, “Lepra e imigração”,
mas seu prestígio como cientista e leprólogo asseguraram-lhe
o privilégio de externar seu ponto de vista numa conferência,
proferida em 5 de novembro de 1915, perante autoridades do governo,
médicos, estudantes e jornalistas, entre outros. O Jornal
do Commercio transcreveu a conferência em que Lutz
defendeu o ponto de vista de que a transmissão da lepra
se dava por intermédio de mosquitos (Culex
fatigans ou Stegomyia fasciata) que haviam picado doentes
quando estes se encontravam em períodos febris, com presença
de bacilos no sangue. Cioso de sua autoridade, Lutz atribuiu as
intermináveis querelas sobre a transmissão da lepra
a idéias preconcebidas e ao pouco conhecimento da literatura
e da própria moléstia entre os médicos, tanto
no Brasil como no exterior.
Seus principais adversários não eram os defensores
da transmissão hereditária, então em minoria,
mas do contágio – entendido como transmissão
direta, pessoa a pessoa. Para neutralizar seus argumentos, Lutz
forneceu dados a respeito do surgimento concomitante da lepra
e dos mosquitos no Havaí em fins de 1820, quando o idioma
local sequer possuía palavra própria para designar
a doença. No entanto, como era muito recente a entomologia
médica, o estudo comparativo da distribuição
da lepra e dos mosquitos resultava impreciso. Além disso,
ou talvez por causa disso, a pluralidade de hipotéticos
hospedeiros que o bacilo de Hansen teria nas diferentes regiões
do globo constituía outro fator perturbador da teoria de
Adolpho Lutz.
Sua conferência desencadeou acalorados debates. Lutz tinha
partidários incondicionais como Henrique Aragão,
também do Instituto Oswaldo Cruz, e Emílio Gomes,
antigo bacteriologista da saúde pública carioca.
A maioria dos integrantes da Comissão de Profilaxia da
Lepra conciliou a hipótese da transmissão culicidiana
com recomendações profiláticas duramente
segregacionistas que decorriam da crença na contagiosidade
quase ilimitada da lepra. Dentre os adversários de Lutz
sobressaíam Fernando Terra e, especialmente, Belmiro Valverde.
Terra era diretor do Hospital dos Lázaros, catedrático
de dermatologia na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro e presidente
da Sociedade Brasileira de Dermatologia.
Os contagionistas denunciavam, com razão, a falta de dados
experimentais que comprovassem o papel dos mosquitos como transmissores
do bacilo de Hansen; o próprio Lutz reconhecia que a multiplicação
do micróbio no organismo do mosquito, seu suposto hospedeiro
intermediário, era um fato ainda não demonstrado.
Não obstante fosse intransigente contagionista, Valverde
admitia a intervenção de insetos, especialmente
as moscas, que, comprovadamente, transportavam o bacilo da tuberculose,
muito parecido com o de Hansen. Mas tinha argumentos fortes contra
a teoria de Lutz: o Amazonas era o estado mais infestado por mosquitos
no Brasil e, no entanto, haveria lá baixa ocorrência
de lepra.
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