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dolpho
Lutz iniciou suas pesquisas sobre as disenterias quando clinicava
em Limeira. Ao passar pelos Estados Unidos, em 1889, a caminho
do Havaí, falou a respeito dessas pesquisas com William
Osler, no Johns Hopkins Hospital. A instituição
não possuía estudos concernentes ao assunto, e só
no ano seguinte o médico norte-americano descreveria um
caso de abscesso hepático com a presença de amebas,
seguindo-se os trabalhos de Councilman e Lafleur, posteriores
ao de Lutz.
A etiologia das disenterias era, então, muito nebulosa.
Amebas já haviam sido localizadas em cadáveres de
pessoas que sucumbiram a síndromes intestinais diversas,
mas não se havia estabelecido relação de
causa e efeito com aqueles animais protozoários. Seu status
como agentes patogênicos mudou depois que Robert Koch identificou
amebas “profundamente situadas” em cortes histológicos
de cadáveres que autopsiou no Egito, em 1883, quando estudava
o cólera. Seu discípulo Kartulis verificou a presença
de amebas em numerosos casos de disenteria naquele país
e na Grécia, mas não conseguiu dissipar as dúvidas
sobre seu papel patogênico nem demonstrar o parentesco entre
a disenteria “tropical” que estudava e os casos descritos
na Europa por médicos que não viam relação
com as amebas.
No trabalho que Adolpho Lutz publicou em 1891 no CentralBlatt
für Bakteriologie und Parasitenkunde, ele demonstrou
que duas entidades mórbidas vinham sendo confundidas. Males
designados por nomes tão diversos quanto catarro intestinal
agudo e crônico, enterite ulcerosa, abscessos hepáticos
e disenteria crônica ou tropical, entre outros, encaixavam-se
no quadro mórbido causado pelas amebas. Lutz propôs
chamá-lo pelo nome “enterite, com evacuações
sanguinolentas” para diferenciá-lo da disenteria
propriamente dita, que se manifestava como doença infecciosa
aguda, capaz de se disseminar por extensas zonas. Tal distinção
foi comprovada em 1898, quando o bacteriologista japonês
Kiyoshi
Shiga (1870-1957) isolou o agente da disenteria bacilar
(Shigella dysenteriae).
Lutz mostrou que as amebas eram parasitas que se reproduziam dentro
e fora do organismo humano, mas sujeitos a limites estreitos de
temperatura. Essa era, justamente, uma das principais dificuldades
para estudá-las. Imobilizadas pelo resfriamento, as amebas
confundiam-se com outras células, sobretudo nas fezes,
tão ricas em microrganismos. Para observá-las demoradamente,
Lutz criou um aparelho que mantinha a platina do microscópio
aquecida, em temperatura constante, e assim conseguiu desvendar
seus mecanismos de adaptação aos hospedeiros humanos,
a longa persistência no interior de abscessos hepáticos,
e a presença, no interior das amebas, de elementos fornecidos
pelo organismo hospedador, especialmente hemácias.
Os estudos de Adolpho Lutz sobre a disenteria amebiana e outras
doenças intestinais seriam de grande utilidade para ele
durante as epidemias de cólera que, na década de
1890, assolariam importantes regiões do Sudeste brasileiro.
Com a ajuda de outros bacteriologistas, Lutz enfrentou tenaz resistência
de segmento majoritário da classe médica, hostil
ao diagnóstico de cólera, fornecendo, assim, contribuição
decisiva para a consolidação da bacteriologia em
nosso meio.
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