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18 de agosto de 1907 Adolpho Lutz aportou em Belém. Fora
contratado pelo governador do Pará, Augusto Montenegro,
para estudar uma doença que afetava o gado cavalar na Ilha
de Marajó. Durante quatro meses, visitou fazendas dos principais
municípios criadores (Cachoeira, Chaves, Soure e Óbidos,
entre outros) para informar-se sobre as zoonoses reinantes aí.
Baseando-se em observações que havia feito anteriormente
e em trabalhos de outros pesquisadores, Adolpho Lutz verificou
que a doença endêmica na ilha era o mal-de-cadeiras,
também conhecido como escancha, mal-das-ancas, mal-dos-quartos
e quebra-bunda. Teria aparecido em Marajó pela primeira
vez em 1828, constituindo verdadeira epidemia até aproximadamente
1836, quando quase todo o gado cavalar da região foi extinto.
As observações e experiências realizadas pelo
diretor do Instituto Bacteriológico de São Paulo
levaram-no às seguintes conclusões: a doença
identificada no Marajó era a mesma existente no sul do
continente americano, doença causada por uma espécie
de tripanossomo, o Trypanosoma equinum; algumas espécies
de macacos do norte do Brasil e a preguiça constituíam
bons animais de experiência para o estudo daquele protozoário;
a capivara sofria infecção espontânea do mesmo
tripanossomo que afligia os cavalos, representando, assim, uma
ameaça já que servia de reservatório para
o microrganismo; as mutucas pareciam ser as prováveis transmissoras
do mal-de-cadeiras; Lutz verificou, por fim, que certas substâncias
químicas anunciadas como terapias promissoras ainda não
davam resultados satisfatórios nos casos de doenças
provocadas por tripanossomos.
Medicina veterinária, entomologia, parasitologia e química
foram, assim, as áreas percorridas por Adolpho Lutz para
compreender o mal-de-cadeiras. Suas observações
sobre os tripanossomos encontrados na Ilha de Marajó levaram-no
a se posicionar ante as discussões que a esse respeito
travavam Elmassian, Volges, Zabala, Laveran, Mesnil e outros cientistas
europeus. Contrariando Vicente Chermont de Miranda, proprietário
de fazendas no Marajó que publicara trabalho sobre a doença
reinante na ilha, diagnosticando-a como cisticercose eqüina,
o diretor do Instituto Bacteriológico sustentou que se
tratava de uma tripanossomíase, a única observada
em animais domésticos no Brasil até aquele momento.
Diante da impossibilidade de se chegar a diagnóstico clínico
preciso pela simples observação dos animais, Lutz
recomendou a realização de exames microscópicos
do sangue de animais enfermos.
Após criteriosas observações, que conferiam
muita importância às condições naturais
da região, Lutz pôs-se a investigar o modo como a
doença era transmitida por meio da inoculação
direta do protozoário no sangue, direcionando sua atenção
para os insetos dípteros, tema que o fascinava havia algum
tempo. Nas áreas infeccionadas, encontrou grande quantidade
de duas espécies de tabanídeos
já descritas e denominadas havia cerca de 80 anos, mas
as poucas experiências por ele realizadas não trouxeram
certeza sobre o modo preciso como transmitiam a doença.
Adolpho Lutz propôs, como profilaxia, que não se
introduzissem animais infeccionados na ilha, que se eliminassem
os cavalos infectados e as capivaras, e ainda que se estudassem
meios capazes de proteger os animais contra as mordeduras das
mutucas. Após sua transferência para o Instituto
Oswaldo Cruz (1908), o cientista dedicaria cada vez mais tempo
às pesquisas sobre parasitas e dípteros hematófagos,
nutrindo especial interesse pelos simuliídeos e tabanídeos.
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