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A febre amarela entra no debate 

Lutz e a confirmação da teoria havanesa 

O esclarecimento do modo de transmissão da malária pelos ingleses e italianos, em 1898-1899, ocasionou imediata reorientação dos estudos sobre febre amarela no Instituto Bacteriológico de São Paulo e suscitou graves cisões em sua equipe. Ainda nesse ano, Vital Brazil levantou as primeiras objeções experimentais ao bacilo icteróide, e Adolpho Lutz começou a estudar a distribuição do Stegomyia fasciata no Brasil. Em fevereiro de 1900, Artur Vieira de Mendonça, fiel a Sanarelli, exonerou-se do Instituto por divergir de Lutz a esse respeito.

As conclusões das experiências realizadas em Cuba pela comissão Reed foram apresentadas ao 3° Congresso Panamericano, em Havana, em fevereiro de 1901, ao mesmo tempo em que o general William Gorgas dava início à campanha contra o mosquito naquela cidade. Já a partir de janeiro de 1901, as comissões sanitárias que atuavam no interior de São Paulo incorporaram o combate ao mosquito ao repertório de ações contra a febre amarela. Em fins daquele ano, Lutz obteve do presidente do estado, Francisco de Paula Rodrigues Alves, autorização para reproduzir aquelas experiências na capital paulista, considerada isenta de febre amarela. O objetivo era neutralizar as reações à chamada teoria havanesa em São Paulo e no Rio de Janeiro, articuladas, sobretudo, por médicos alinhados com o bacilo de Sanarelli e outros micróbios.

A primeira série de experiências projetadas por Lutz transcorreu de 15 de dezembro de 1902 a 20 de janeiro de 1903. Durante cinco sessões, seis homens adultos deixaram-se picar por mosquitos previamente infectados no primeiro e segundo dias de um caso leve diagnosticado em São Simão. Os pormenores do teste foram registrados em atas lavradas por uma comissão médica chefiada pelo dr. Luiz Pereira Barreto, presidente do Senado do estado, e da qual fizeram parte o próprio Adolpho Lutz e Emilio M. Ribas, entre outros.

Três dos quatro pacientes contraíram a febre amarela, mas ela não se manifestou no quarto voluntário e em duas “cobaias” extras – Lutz e Ribas, que também se submeteram às picadas. Na segunda série de experiências, entre 20 de abril e 10 de maio de 1903, três voluntários italianos foram confinados em quartos protegidos contra mosquitos e repletos de roupas e objetos sujos de urina, vômito e fezes de amarelentos. Sujeitaram-se a esse suplício por dez dias e ficaram mais dez em observação, sem manifestar sinais da doença. Os médicos encarregados de expor os resultados das experiências excluíram, então, a transmissão dos germes da febre amarela por objetos contaminados e foram categóricos em assinalar que somente no corpo do mosquito encontravam ambiente favorável à sua evolução.

Enquanto os dirigentes da saúde pública paulista aderiam à teoria havanesa, os do Rio mantinham posição reticente. Nuno de Andrade, diretor-geral de Saúde Pública, considerava que os norte-americanos não tinham reunido provas conclusivas em favor da transmissão da febre amarela exclusivamente pelo mosquito. O fato é que as teses da comissão Reed estavam sub judice, e só algum tempo depois seriam endossadas pela comunidade científica internacional. Para isso foram decisivas as campanhas sanitárias realizadas em São Paulo e, sobretudo, no Rio de Janeiro, nos primeiros anos do século XX. A teoria de Finlay, demonstrada, na prática, por Lutz, Ribas e Oswaldo Cruz revelou-se capaz de neutralizar as epidemias nos núcleos urbanos litorâneos da América, mas somente por algum tempo. A descoberta da febre amarela silvestre, em 1930, alteraria a configuração do problema sanitário representado pela febre amarela, acarretando mudanças nas estratégias profiláticas que têm em mira o seu controle.